Quarta-feira, 21/09/2011
Antônio Costa/Gazeta do Povo
Incêndio causado por balão em uma fábrica de álcool no bairro Taboão, em Curitiba, no dia 7 de agosto deste anoSoltar balões torna-se prática profissional
Protegidos pela clandestinidade, baloeiros despendem tempo e dinheiro na atividade, que é documentada em vídeos e fotos
Publicado em 19/09/2011 | Rafael Waltrick- Fale conosco
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A soltura de balões no estado chega a gerar produtos que são comercializados por meio de um site na internet. Uma produtora de Curitiba, intitulada Capital Ecológica, reúne em DVDs imagens feitas por cinegrafistas amadores nas chamadas “revoadas”, ocasiões em que vários grupos se reúnem no mesmo local para soltar os balões.
Reprodução de DVDs que mostram ação de baloeiros
Repressão
Soltar balões é crime previsto em lei:
Legislação
- O artigo 42 da Lei de Crimes Ambientais prevê detenção de um a três anos e/ou multa para quem for flagrado fabricando, vendendo, transportando ou soltando balões.
Apreensão
- Nos últimos cinco anos, 506 balões foram apreendidos e 225 pessoas foram presas no estado. Somente entre 2006 e 2008, as multas expedidas para os praticantes flagrados chegaram a R$ 1 milhão.
Denúncias
- Podem ser feitas pelos telefones 190 e 0800-643-0304.
Balões sem fogo surgem como alternativa
Como forma de legalizar a prática, baloeiros paranaenses estão se mobilizando para tentar implantar no estado a utilização dos chamados balões sem fogo. A nova modalidade, já comum no Rio de Janeiro e em São Paulo, usa ar quente apenas para fazer o balão subir. O estado vizinho, inclusive, já promoveu eventos autorizados pelo poder público para a exposição e soltura de balões que não possuem tochas de fogo.
Em Curitiba, baloeiros se organizam para criar uma associação própria, chamada Somos Arte Papel e Cola (Sapec). Segundo representantes da Sapec, o grupo aguarda uma última licença da prefeitura para atuar oficialmente. A regulamentação da soltura de balões sem fogo será a principal bandeira da Sapec.
“Todo mundo quer mostrar seu balão. E o uso do balão sem fogo vem ao encontro disso”, relata um dos baloeiros, que preferiu não se identificar. “Tenho certeza de que se houvesse regulamentação, 80% dos grupos adotariam essa nova prática”, completa.
O comandante do Batalhão de Polícia Ambiental, coronel Daniel Jacinto Berno, reconhece que a alternativa poderia ser adotada para viabilizar eventos públicos, já que a soltura de balões sem fogo não se configura como crime – o artigo 42 da Lei de Crimes Ambientais faz menção apenas a balões que possam provocar incêndios. O comandante alerta, porém, que a soltura também deve obedecer a regras de tráfego aéreo, para evitar acidentes com aeronaves. (RW)
Entrevista
Morador de Curitiba, Alfredo* começou a soltar balões ainda na infância, aos 7 anos. Hoje, aos 29, é um ferrenho defensor da prática, que considera uma “arte”.
Os DVDs podem ser comprados por até R$ 12 e são encaminhados diretamente para a casa do comprador. A produtora oferece mais de 20 compilações diferentes – há até séries especiais, como as sobre “resgates de balões mais emocionantes” e “os balões que marcaram época”.
Documentar a produção, soltura e resgate dos balões, aliás, é procedimento comum entre os praticantes. As fotos e vídeos são utilizadas como “provas” para um campeonato anual chamado Boca de Ouro. Como eventos com grande número de pessoas chamaria a atenção das autoridades, os balões são soltos no decorrer do ano e, em posse das imagens, jurados analisam quais grupos se destacaram, em várias categorias.
Investimento
Henrique*, morador de Curitiba, de 40 anos, se orgulha de fazer parte de um dos grupos mais ativos e premiados do estado. O grupo monta e solta balões há 20 anos. A dedicação à atividade é tamanha que, para a produção dos artefatos, os baloeiros chegam a projetar o balão no AutoCAD, programa de computador usado principalmente por engenheiros. E, na hora da montagem, papéis importados são priorizados, juntamente com fios de kevlar (material usado em coletes à prova de balas).
“Hoje em dia, montar um balão de 16 metros pode demorar de seis meses a quase um ano”, relata Henrique. “É algo complexo. Não é apenas ir em uma banquinha da esquina e comprar meia dúzia de seda.”
Apesar de não citar valores, outro baloeiro, que não quis se identificar, reforça que a prática “toma muito tempo e dinheiro”. Mesmo assim, os investimentos valem a pena, garante. “Construir o balão é como uma terapia. Você trabalha o dia inteiro e, quando chega a noite, pode se reunir com seus amigos para relaxar”, afirma o baloeiro, adepto da prática há 22 anos.
Repressão
O Corpo de Bombeiros não tem estatísticas sobre o número de incêndios causados por balões no Paraná. O Batalhão de Polícia Ambiental, porém, alerta que a prática é crime e deve ser denunciada pela população. O último incêndio envolvendo um balão no estado ocorreu no dia 7 de agosto, em uma fábrica de álcool no bairro Taboão, em Curitiba. Não houve vítimas, mas os prejuízos chegaram a R$ 15 milhões.
O comandante do batalhão, coronel Daniel Jacinto Berno, afirma que a polícia conhece os grupos e a identidade de muitos praticantes. A repressão, porém, encontra dificuldades devido à própria legislação: os baloeiros só podem ser detidos em flagrante, no momento da fabricação, soltura e transporte dos balões.
* O nome foi trocado a pedido do entrevistado.
Responsáveis pelos vídeos cometem crime
Para o Ministério Público, os responsáveis pelos vídeos da produtora Capital Ecológica, que comercializa DVDs com compilação de imagens de soltura de balões no estado, podem responder criminalmente por apologia ao crime e até formação de quadrilha. Os vídeos mostram grupos reunidos montando e soltando balões em encontros no interior do Paraná. Em um dos DVDs assistidos pela reportagem, é possível ver crianças e adolescentes auxiliando na soltura dos artefatos.
Nos filmes, os grupos chegam a ser identificados pelos nomes e medidas dos balões soltos. Uma mensagem antes dos vídeos afirma que o DVD “não faz ensino, incentivo ou apologia referente ao seu conteúdo, apenas reúne imagens fornecidas por cinegrafistas amadores”.
Segundo o promotor de justiça do Meio Ambiente Sérgio Luiz Cordoni, a mensagem não isenta a produtora de responsabilidade pela compilação e comercialização das imagens. “Isso é apologia ao crime. É importante lembrar que pessoas envolvidas nessa prática não respondem só pelo artigo 42 [da Lei de Crimes Ambientais], mas também por apologia ao crime e formação de quadrilha”, defende.
A produtora Capital Ecológica afirma que não participa dos eventos e que agora está focada na cobertura de encontros com balões sem fogo, que já ocorrem em São Paulo e Rio de Janeiro. “Entendemos que a veiculação das imagens têm intuito informativo, de algo que está acontecendo, e que as autoridades e imprensa em geral somente recriminam, e não pensam em uma forma de reverter tal prática”, afirmou a produtora em e-mail enviado à reportagem. O responsável pela empresa não se identificou.
Interatividade
A utilização de balões sem fogo pode ser uma saída? Por quê?
Escreva para leitor@gazetadopovo.com.br
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